O Autômato ou "O Turco"

O Automato, popularmente conhecido como "O Turco", foi uma das mais intrigantes e enigmáticas criações do entretenimento do século XVIII e XIX. O Turco era uma máquina que parecia jogar xadrez, de maneira surpreendentemente habilidosa, desafiando e derrotando seus adversários. Os espectadores eram levados a acreditar que o mecanismo era capaz de jogar xadrez de forma autônoma, mas na verdade era um engenhoso truque de mágica.

Ele foi construído em 1770 por Wolfgang von Kempelen (1734–1804), inspirado em um número de mágica apresentado por François Peletier para a Imperatriz Maria Teresa, da Austria. Kempelem desafiou a corte dizendo que apresentaria um número ainda melhor e em 6 meses construiu o autômato para sua apresentação de ilusionismo.

A estrutura do Automato era composta por uma grande caixa de madeira, em forma de mesa que abrigava uma figura vestida com um hobe otomano e turbante, carregando um longo cachimbo e um braço erguido sobre um tabuleiro de xadrez.

A base da caixa sob a mesa continha diversas portas, que quando abertas expunham uma série de mecanismos e engrenagens. A apresentação começava com Kempelen abrindo essas portas e permitindo em parte que a plateia visse através de todo o conjunto. Na verdade o mecanismo visível se extendia por apenas 1/3 da mesa e não tinha serventia alguma a não ser confundir a atenção do público. Na parte de trás ficava um alojamento oculto, onde um operador se escondia. O mecanismo de fato consistia num pantógrafo que movia o braço pela ação do operador. Este era capaz de ver os lances por baixo da mesa por meio de um sistema de imãs embutido no tabuleiro e nas peças. Isso permitia identificar a peça movida pelo desafiante e sua casa de destino.

Wolfgang von Kempelen
Wolfgang von Kempelen

O operador era um jogador de xadrez habilidoso e o design da máquina era sofisticado a ponto dos espectadores não conseguirem perceber sua presença. Muitos se deixavam levar pela ideia de que estavam diante do que chamamos hoje de uma verdadeira inteligência artificial.

Não se sabe quem foi o operador durante as apresentações realizadas por Kempelen.

Apesar do tremendo sucesso da primeira apresentação do autômato, Kempelen não se interessava muito mais pela máquina, querendo se dedicar a outros projetos. Nos 10 anos seguintes ele só realizou mais um desafio e em seguida a desmontou.

No entanto em 1781 ele recebeu ordem do Imperador Joseph II, filho mais velho e sucessor de Maria Theresa de reconstruir a máquina e fazer uma nova apresentação para a visita do Grand Duque da Russia. Seu sucesso foi enorme e o Grand Duque convenceu, inicialmente a contra gosto de Kempelem, que ele fizesse um tour pela europa com o autômato. Em 1783 se apresentou em Versalhes e em seguida foi montado no Café de La Regence, onde é claro perdeu várias partidas. Philidor chegou a jogar contra a máquina na academia de ciências e a venceu sem esforço, descrevendo segundo relatos como sendo a partida mais cansativa de sua vida. Jogou também contra Benjamin Franklin, que servia como diplomata em Paris na época. A maquina também passou por temporadas em Londres, Leipzig e Dresdem.

Kempelen morreu em 1804 e seu filho vendeu o Turco para Johann Nepomuk Mälzel um musico da Bavaria com curiosidade em aparelhos mecânicos, que deu sequência as apresentações.

Em 1809 O turco se apresentou para Napoleão I, sendo operador nesse jogo o Mestre alemão Johann Baptist Allgaier. Os detalhes dessa partida são uma historia a parte. Primeiro de tudo “O Turco” saudou Napoleão antes do início da partida. Napoleão sentou-se em uma mesa de xadrez separada, para não poder se aproximar da área do turco, com Mälzel intermediando os lances de cada jogador. Napoleão fez a primeira jogada em vez de permitir que o turco fizesse o primeiro movimento, como era de costume. Mälzel permitiu que o jogo continuasse. Pouco depois, Napoleão tentou um movimento ilegal. Ao perceber o movimento, o Turco devolveu a peça ao seu local original e continuou o jogo. Napoleão tentou outro movimento ilegal uma segunda vez, e o turco respondeu removendo a peça do tabuleiro completamente. Napoleão então tentou uma terceira vez um lance ilegal e o turco respondeu com um movimento de seu braço, derrubando todas as peças do tabuleiro. Napoleão teria se divertido, e então jogou um jogo de verdade com a máquina, completando dezenove movimentos antes de derrubar seu rei.

Na sequencia passou por milão em 1811 se apresentando para Eugène de Beauharnais, Principe de Veneza e Vice-Rei da Itália. O Principe gostou tanto da apresentação que ele fez uma oferta e comprou o Turco por um valor 3 vezes maior do que Mälzel pagou para o filho de Kempelen. A máquina permaneceu por 4 anos na Itália e foi recomprada por Mälzel em 1815.

Mälzel voltou com a máquina ao Café de La Regence em Paris, onde permaneceu até 1818 e fez relacionamentos com os jogadores locais. Em 1818 partiu para um tour na ilha britânica com extremo sucesso.

No tour Ingles, por um pequeno período o operador foi Hyacinthe Henri Boncourt, um jogador da era Philidor, mas que nunca teve oportunidade de jogar com o grande mestre devido seu exilio. Naquele tempo ele já não era uma dos melhores da França. Durante uma de suas apresentações estava acometido de uma gripe e não só sua qualidade de jogo estava comprometida como acabou tendo um acesso de tosse, que fez a plateia perceber o truque para constrangimento de Mälzel. Mälzel incluiu melhorias para que as engrenagens fizessem ruido para disfarçar qualquer som inconveniente do operador.

Também operaram a máquina nessa época o inglês William Lewis e o Frances Jacques François Mouret, que foi o jogador de melhor performance com o Turco.

Em 1826 atravessou o atlântico para tours nos Estados Unidos e em Cuba. Em 1836 Edgar Alan Poe escreveu um ensaio sobre o turco. 1838 foi o derradeiro tour do Turco. Estando em Havana, Schlumberger que era o operador na época adoeceu com febre amarela, vindo a falecer. Mälzel recolheu sua máquina e durante a longa viagem de volta a Europa também adoeceu e morreu no Mar.

Depois disso o aparelho mudou de mãos algumas vezes, ainda fazendo performances nos Estados Unidos. Acabou terminando seus dias num museu da Philadelphia, onde em 1854 foi destruído por um incêndio.

Kempelen

John Gaughan, um fabricante americano de equipamentos para mágicos em Los Angeles, começou a construir em 1984 sua própria versão da máquina de Kempelen. Após 5 anos construindo realizou a primeira exibição pública em novembro de 1989 em uma conferência de história da mágica. A máquina usa o tabuleiro de xadrez original do Turco, que foi armazenado separadamente e por isso poupado do incêndio. A máquina foi apresentada reproduzindo a mesma forma da apresentação de Kempelen..